terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Entenda por que sensação de calor continua mesmo após exercício

É um dia frio e você acabou de terminar uma cansativa sessão na academia, suando em cima de uma esteira. Ou numa aula de spinning. Ou nadou quilômetros na piscina. Ou acabou de terminar uma longa corrida ou um duro percurso de bicicleta. 

Agora você tomou um banho e trocou de roupa. Parou de transpirar, mas ainda se sente quente. Subitamente, sua casa fria e seu escritório não parecem mais tão gelados. 

Pesquisadores de atividades físicas costumavam dizer que isso era um bônus do exercício --que você queima calorias não só enquanto se exercita, mas também por horas depois de parar, até mesmo pelo resto do dia. O exercício, eles diziam, tem um efeito significativo sobre a perda de peso graças ao chamado consumo de oxigênio em excesso pós-exercício. 

Mas então apareciam aqueles "do contra", relatando que esse efeito era apenas um mito. O ritmo metabólico volta ao normal logo que o exercício chega ao fim, informaram pesquisadores. 

Ainda assim, muitos que se exercitam insistem que deve haver alguma mudança em seu metabolismo. Se não, por que eles se sentiriam tão quentes? Se não é um ritmo metabólico acelerado, então o que é? 

Paul Laursen, fisiologista de desempenho da Academia de Esportes da Nova Zelândia, compete nos triatlos Ironman. Os exercícios prolongados e intensos fazem parte de sua vida. Ele sentiu o efeito continuado, diz ele, após uma recente corrida de bicicleta de 90 milhas (cerca de 140 km). 

"Era uma grande sessão de treino com amigos, os níveis de testosterona estavam altos, e estávamos todos tentando ultrapassar uns aos outros nas subidas", escreveu Laursen por e-mail. "Foi como se eu estivesse com febre pelo resto do dia. E continuou durante a noite. Minha esposa dormiu com uma coberta, mas eu quis somente o lençol. Meu corpo parecia uma fornalha". 

Acontece que não existe uma resposta fácil para por que pessoas como Laursen se sentem tão quentes. 

"De uma coisa temos certeza: seu metabolismo vai às alturas quando você se exercita", afirmou Nisha Charkoudian, professora de fisiologia na Faculdade de Medicina da Mayo Clinic, em Rochester, Minnesota. 

"Então, quando você para, o fato interessante --e que não compreendemos-- é que sua temperatura corporal fica alta por cerca de duas horas." 

O efeito depende muito da intensidade de seu exercício. "Se você sai para uma caminhada, sua temperatura não sobe tanto", disse Charkoudian, mas ao correr intensamente por uma hora, você pode ter o que se parece com uma febre: uma temperatura de aproximadamente 38ºC. 

É um efeito que Glenn Kenny, professor da Escola de Cinética Humana e Ciências da Saúde da Universidade de Ottawa, passou anos pesquisando. Ele construiu uma máquina de US$ 1 milhão --a única do mundo, segundo ele-- que pode medir alterações minuto a minuto na perda de calor corporal. 

Ela se parece com uma lata gigante. O indivíduo se senta em seu interior e pedala numa bicicleta reclinada. O dispositivo pode detectar a quantidade de calor dissipada pelo corpo do indivíduo a cada momento do exercício, e a cada momento do descanso pós-exercício, sob diferentes condições temperatura do ar maior ou menor, mais ou menos umidade. 

A partir de experimentos com o dispositivo, Kenny descobriu a razão para o estado febril que aparece quando a temperatura básica do corpo está elevada: isso não ocorre porque você continua queimando calorias no mesmo ritmo do exercício, mas porque o corpo tem dificuldade em se livrar do calor adicional que foi gerado durante a sessão. A dissipação de calor é acentuadamente reduzida após o exercício: por algum motivo, o corpo simplesmente não consegue eliminar o calor extra que ganhou. 

Kenny imagina que o efeito esteja relacionado aos efeitos do exercício sobre o sistema cardiovascular. Porém, mesmo se sentindo quente, você não está queimando mais calorias, diz ele, e portanto não irá perder mais peso. 

De outros estudos, onde mediu ritmos metabólicos, ele descarta afirmações de que o exercício também poderia elevar a taxa com que as pessoas queimam calorias nas horas subsequentes. Ele descobriu que qualquer efeito sobre o metabolismo pós-exercício era tão pequeno que chegava a ser imensurável, e tão passageiro que acabava em até cinco minutos depois da interrupção. Seus participantes, porém, não eram pessoas como Laursen. 

Os participantes do Joseph LaForgia eram. Ou eram, pelo menos, atletas experientes. LaForgia, um fisiologista de atividades físicas da Universidade do Sul da Austrália, diz que as pessoas que se exercitam intensamente --fazendo corridas frequentes, por exemplo-- podem sentir um efeito metabólico prolongado. Suas taxas metabólicas podem subir e permanecer altas por sete horas depois do fim dos exercícios. 

Mesmo assim, as calorias adicionais queimadas representavam cerca de 10% das calorias queimadas durante os exercícios intensos. Quanto às pessoas que se exercitavam moderadamente, como faz a maioria, o pequeno aumento no metabolismo não durou mais de duas horas e acumulou apenas 5% da quantidade queimada no exercício. E como uma sessão modesta de exercícios queima muito menos calorias que uma sessão intensa, as pessoas que se exercitavam moderadamente acabavam com uma queima adicional subsequente muito pequena. 

Mas isso ainda deixa uma dúvida. Se sua taxa metabólica aumenta levemente, por que você se sentiria mais quente por até sete horas após uma malhação longa e intensa? 

LaForgia diz não ter estudado as sensações de calor, e Kenny diz que se alguém se sente quente por tanto tempo, esse não seria um efeito da dissipação retardada de calor. 

Em vez disso, a sensação poderia ser causada por outro efeito do exercício --os esforços do corpo em reparar sutis danos nos tecidos, causados por toda aquela atividade. O sistema imunológico pode entrar na jogada, assim como as enzimas que reparam músculos e precisam de energia produtora de calor. 

Talvez os efeitos geradores de calor da reparação de danos sejam o motivo para Laursen ter chutado as cobertas naquele noite, após seu percurso de 90 milhas (cerca de 140 km).
Se esse for o caso, ele provavelmente não estava queimando muitas calorias extras. Porém, mais uma vez, a longa pedalada pelas montanhas da Nova Zelândia havia queimado mais do que o suficiente.

GINA KOLATA

DO "THE NEW YORK TIMES", via Folha.com

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